DICAS DE ROMA - TRAJETOS E PARADAS IMPERDÍVEIS
Por diversas circunstâncias, há
50 anos tenho ido a Roma com regularidade. Estive lá como
turista deslumbrada, como exilada saudosa, como mochileira, como
jornalista fazendo cobertura profissional, como conferencista, como
autora lançando livro e com agenda pesada a cumprir, como
viajante descompromissada, como guia de meus filhos em suas descobertas
da Cidade Eterna. Hospedei-me em pensões modestas, em casa
de amigos queridos, em hotéis de quase tudo quanto é
categoria, em apartamentos de italianos (com ou sem a presença
dos donos).
Lá passei longas temporadas ou apenas
poucos dias de conexão entre viagens. Cozinhei, fiz feira,
fui a sapateiro e lavanderia, apanhei filha de amigos na escola,
fui a festas – inclusive a uma do pessoal de cinema, levada
por Glauber Rocha, que parecia saída de um filme de Fellini.
E, como sou andarilha contumaz, curiosa e exploradora, posso dizer
que conheço Roma razoavelmente . Já escrevi um texto
que foi publicado lá mesmo, entre romanos, numa antologia
sobre a cidade.
Por isso, este guia de Elza Maria me surpreendeu.
Ela conhece tudo. Desde que essas páginas me caíram
nas mãos pela primeira vez, achei que mereciam ser publicadas
e estar ao alcance de todos. Na ocasião, eu presidia a Academia
Brasileira de Letras e cumpria um programa oficial em Roma, hospedada
em nossa embaixada, o belíssimo Palácio Pamphili,
situado na Piazza Navona, diante de deslumbrantes esculturas e fontes
de Bernini. No meu quarto, entre vários mimos delicados,
havia uma pilha de folhas impressas com esse título despretensioso:
Dicas de Roma. Sem qualquer indicação de autoria.
Comecei a folhear e fui de surpresa em surpresa.
Ia muito além da simples listagem de monumentos ou da indicação
de restaurantes. Antes de mais nada, a seleção era
excelente e muito completa. Além disso, não se limitava
ao óbvio: trazia boas informações de bastidores
e detalhes saborosos, além de conselhos úteis e práticos.
Os critérios de escolha revelavam alguém inteligente
e com senso de humor, além de muito bem informada. E capaz
de escrever com graça, originalidade e clareza.
Ao elogiar os comentários e procurar
me informar sobre sua autoria, soube, pela embaixatriz Marlene Bahadian,
que ela também gostava muito das dicas – tanto que,
com sua generosidade, resolvera incorporá-las à hospitalidade
brasileira da casa. E os cumprimentos eram gerais, por parte de
todos os hóspedes que tinham acesso a elas. Soube também
que aquelas bem traçadas linhas haviam sido elaboradas por
Elza Maria da Costa e Silva Lima, casada com um diplomata que servira
em Roma algum tempo antes e já fora removido para outro posto.
Não pude, portanto, conhecer a autora, como queria. Limitei-me
a reforçar a louvação coletiva.
Poucos meses depois, porém, tive outro
compromisso profissional, dessa vez em Chicago. E lá estava
Elza Maria em pessoa, a me receber. Dessa vez, me acompanhou a museus
e me deu preciosas indicações sobre os melhores roteiros
para apreciar a instigante arquitetura na cidade, incluindo um inesquecível
tour de barco que me propiciou uma visão de conjunto enriquecedora
e ângulos privilegiados de contemplação. Convencida
de que ela é uma grande viajante, e sabe compartilhar esse
dom, procurei animá-la a publicar o guia de Roma que tanto
me encantara. Modesta, ela relutava, mesmo diante de minha insistência.
Só cedeu quando tive o inesperado reforço de seu pai
e meu confrade, o acadêmico Alberto da Costa e Silva, poeta,
historiador e africanólogo incomparável. Pedido de
pai amado a gente não recusa. Então, louvo Elza Maria
e agradeço a Alberto.
Fico contente em saber que, agora, temos a Roma
de Elza Maria ao alcance de muita gente. Ir a Roma é sempre
um prazer. Ir com ela será uma alegria redobrada.
Ana Maria Machado
***
Durante pouco mais de dois anos, morei
em Roma. Gabava-me de conhecer bem a cidade, até que a ela
voltei duas décadas mais tarde e, na companhia de Elza
Maria, percorri os caminhos que tinha por conhecidos. Em cada
um de nossos passeios, minha filha me fazia ver o que dantes não
vira, ou vira imperfeitamente. Ela não só sabia de
cor cada recanto da cidade, mas, sem se cansar de revisitá-los,
os iluminava de bem-querer. As andanças por Roma com Elza
Maria - do mesmo modo que, mais tarde, as por Chicago, onde também
viveu, e de cuja arquitetura se enamorou - eram, ademais, aulas
de alegria. Como se ela se sentisse no centro de uma grande festa,
na qual compartilhava conosco as revelações da beleza.
É essa Elza Maria a mesma que, neste livro, desenha, com
traços breves e nítidos, a Roma de suas saudades,
e nos propõe roteiros para que encontremos a nossa.
Alberto da Costa e Silva
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