POLITICAMENTE CORRETÍSSIMOS
Diego Casagrande
em 22/08/2003
Por que o sr. resolveu lançar este Politicamente
Corretíssimos?
Descobri que os textos guardavam entre si uma unidade surpreendente
e, o que era estimulante, questionavam temas e fatos atualíssimos
no contexto nacional e internacional. Por exemplo: no exame do recrudescimento
do terrorismo no seio do estado moderno, antes do dia 11 setembro
em Nova Iorque, e na expansão de sua prática sistemática no ocidente
a partir da divulgação do “Catecismo Revolucionário”, de Serguei
Netchaiev, adotado fielmente por Lênin, Fidel e Marighella nas suas
escaramuças revolucionárias, e que, salvo exceção, só os profissionais
do terror conhecem.
No caso da flexível ética marxista, hoje bastante
em voga, faço levantamento acurado em “Sobre a moralidade de Marx”
da conduta e os métodos utilizados por Karl Marx, o pai do “socialismo
cientifico”, junto a amigos, familiares e adversários em geral,
que nos leva à explicação possível da criminosa moralidade adotada
por tipos como Lênin, Stalin, Fidel Castro e Pol Pot. No estudo
denominado “Marx e o Pensamento dos Outros”, analiso de forma didática
como Marx chegou ao conceito do Materialismo Histórico, que julgo
sumamente oportuno e esclarecedor, visto que no Brasil o marxismo,
ainda que retardatário, predomina de modo absoluto como “práxis”
acadêmica.
O Sr. trata de modo impertinente a questão
do estado no Brasil. Faz sentido discutir o “papel do estado”?
A questão do estado no Brasil é um caso de polícia. A nossa frágil
democracia, no momento, vem sendo encaminhada, muito manhosamente,
em cima do mito da “participação”, da supremacia do público em detrimento
do privado. O modelo, delineado por Rousseau, é de origem grega
e conciliava democracia com escravidão, ou, na melhor das hipóteses,
uma democracia de poucos. Tudo isso nos leva à Gramsci, o fanático
teórico comunista italiano, com sua “revolução passiva”, em que
o estado torna-se instrumento do “Partido Hegemônico”, e este é
elevado à categoria do Grande Pensador e Agente da transformação
revolucionária. Na leva do Estado “participativo”, apanágio de corporações
e conselhos na eterna busca do “consenso”, são estabelecidos amplos
privilégios às legiões de burocratas, corporações e castas disfarçadas
que usufruem diuturnamente das isenções fiscais, isonomias, empréstimos
a fundo perdido, salários mirabolantes e aposentadorias milionárias.
A malta de Brasília está se apropriando hoje de cerca de 40% do
que a sociedade produz (o PIB, algo em torno de R$ 1 trilhão e 90
bilhões), torrando tudo com a própria máquina e seus programas quase
que integralmente inúteis. Como o governo toma a poupança privada,
empresários e forças produtivas não têm recursos para investir nos
seus negócios e indústrias, e, por extensão, não se cria emprego,
valor agregado nem muito menos o desenvolvimento científico e tecnológico.
Não é de estranhar que a miséria e a violência se alastrem em proporção
geométrica na medida em que o estado, com sua burocracia e legiões
de privilegiados, volta-se para à “inclusão social” e o combate
à fome. É um massacre. Afonso Arinos, o nosso grande mestre, dizia
que o Brasil, antes de ser nação, era “império”, mas não um império
do tipo romano, mas “império interno”, o governo colonizando o próprio
povo. Qual é a dúvida?
Mas existe outro tipo de democracia?
Claro, a democracia constitucionalmente representativa dos ingleses
e dos americanos, por exemplo, onde o individuo limita o estado
- e não o estado o indivíduo, como ocorre no Brasil e no grosso
da América Latina (o Chile parece que está escapando do carma).
O objetivo das democracias que deram certo não é a soberania do
estado, especialmente intervencionista, mas a segurança do privado
e a vigência das liberdades individuais. Só quando se respeitam
as liberdades privadas e individuais a sociedade cresce econômica
e politicamente. É respeitando a ação e a eficiência da livre empresa
e tosando as garras das corporações e a voracidade da máquina estatal
que a sociedade prospera. Fora disso a democracia desanda em manhosa
usurpação escravocrata, ainda que acobertada por adjetivação tipo
“democracia direta”, “participativa” ou “pluralista”. No Brasil
atual, o estado tornou-se patrimônio de uma gigantesca oligarquia
burocrática que usufrui (por força da violência legal e da ignorância
da população) de forma genérica de quase toda riqueza produzida
pela sociedade. De fato, sobra uma “baba” para as corporações e
as castas de serviço que coonestam o sistema. Mas o povão, o velho
povão – este só trabalha e paga impostos. Seria bom lembrar a Lula
que a falência das repúblicas socialistas e das democracias populares
(que não eram democracias nem populares), ocorreu quando caiu o
mito das transformações revolucionárias e as idéias de liberdade
e justiça foram congeladas em burocracia - o reinado tirano da “nomenklatura”.
O Sr. tem consciência de que sua passagem
pela Secretaria Nacional de Cultura é vista como negativa por certa
camada da nossa vida artística e do show bizz?
Não só de certa camada da vida artística e do show bizz, mas da
burocracia também. Na breve temporada que passei em Brasília, fui
ameaçado e vilipendiado dia e noite pela fauna da nomenklatura.
O que a ditadura militar e o hiper-inflacionário (e estróina) governo
da Nova Republica levaram anos para criar e expropriar dos trabalhadores
e do cidadão contribuinte, ajudei a desmontar em menos de seis meses.
Se você disser a um “semi-Deus” da vida artística que, ao usufruir
os milhões de reais dos cofres públicos e manter status de beautiful
people, é ele também um “cruel” representante das “elites” que despreza,
simplesmente ficará chocado e sua reação será a de, no mínimo, cuspir
na sua cara. Mas o fato é que o sujeito que tem acesso anual aos
milhões ou centenas de milhares de reais da Petrobrás, jamais vai
aceitar que o escorchante preço do transporte coletivo ou do bujão
de gás que a massa escravizada paga é também um pesado ônus que
o seu privilégio de “artista escolhido” impõe. Essa gente, para
mim, é inconsciente ou hipócrita, e não tem a menor diferença da
“elite exploradora” que diz desprezar. De fato, o governo Collor
racionalizou administrativamente a máquina burocrática no âmbito
da cultura e fechou a Embrafilme, reconhecido instrumento de corrupção
e privilégios. Como eu era do ramo e não tinha medo, ajudei a fazer
o que mandava minha consciência de democrata. Agora estão acusando
o “oriental” Gushiken, secretário de Lula, de ser uma nova versão
de Jdanov, criador do realismo socialista e do antiamericanismo
como forma sistemática de atuação cultural. É provável que seja.
Mas o que foi Nelson Pereira dos Santos, um dos atuais mentores
da escala-da estatizante do cinema, senão um religioso divulgador
do Djanovismo no Brasil? O fato é que, com a estatização do cinema
– assunto que abordo em Politicamente Corretíssimos – a Petrobrás
terá mesmo, como vem fazendo, de financiar a fundo perdido a produção,
exibição e até financiar a ida do espectador ao cinema – financiamento,
óbvio, distribuído politicamente pela Petrobrás, via preço (e lucro)
escorchante do combustível e do bujão de gás arrancado do bolso
da patuléia ignara. Mas seria bom avisar a Lula que Gorbachev, face
à fome de 45 milhões de russos, fechou as torneiras da Goskino (comitê
de cinema comunista) na extinta URSS e o próprio Fidel, a quem admira,
limitou os recursos para a produção cinematográfica em Cuba, hoje
circunscrita a três filmes anuais. Na Rússia, hoje, quem quiser
milhões de dólares para fazer filme, pode fazê-lo. Mas terá de sacar
do próprio bolso. Mas quem terá coragem de dizer isso a Lula, visto
que Lula não é Collor?
O que o Sr. acha que vai ocorrer com o lançamento
de seu Politicamente Corretíssimos no atual estágio da vida brasileira?
Acho que desabará uma total cortina de silêncio sobre o livro, ou,
por outro lado, haverá manifestações criticas de ódio e rancor.
As duas coisas não me preocupam. Tenho o lombo grosso e já não sofro
com o criminosamente adverso, como no passado. Mas que será amplamente
lido, mais cedo ou mais tarde, não tenho o menor receio.
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