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CARPEAUX ENTRE OS LIVROS

Se não existe o crítico ideal, existe contudo, na conhecida lição machadiana, o ideal na crítica

Wilson Martins / Crítico literário

Como escrever sobre Otto Maria Carpeaux? (Ensaios reunidos. 1946-1971. Pref. Ivan Junqueira. Vol. II: Dispersos (parte I), prefácios e introduções (parte I). Rio: UniverCidade /Topbooks, 2005). Cumpre caracterizá-lo, antes de mais nada, como ensaísta, não como crítico literário na acepção restrita do termo: se há sempre um crítico dormitando em todo ensaísta, a recíproca não é verdadeira. Há grandes críticos sem o fôlego específico dos grandes ensaístas, sendo diferente entre eles a abertura do compasso intelectual e a profundeza das sondagens já no ponto de partida: o crítico interessa-se necessariamente pela literatura in fieri, no momento em que é produzida, quando ainda se encontra em estado nascente, enquanto a matéria do ensaísta é a literatura facta, a que resistiu ao atrito dos séculos e das modas, a que se inscreve numa ordem definitiva de grandeza.

É como ensaísta das letras e problemas universais - para lembrar o título que marcou em Tristão de Athayde a passagem para Alceu Amoroso Lima, isto é, do crítico para o ensaísta - que Otto Maria Carpeaux se situa como exegeta, abrindo horizontes que tornaram contemporânea a literatura brasileira na história intelectual das nações através dos tempos. Os críticos distinguem-se entre eles por suas divergências e assemelham-se por suas concordâncias, criando uma convivência à primeira vista contraditória em si mesma. É que, como observou um juiz da Suprema Corte norte-americana, não há idéias erradas, verdade que talvez surpreenda os espíritos simples. Ou na "famosa frase de um bispo inglês" que Carpeaux gostava de repetir: "Orthodoxy is my doxy; heterodoxy is another man' s doxy".

Se não existe o crítico ideal, existe contudo, na conhecida lição machadiana, o ideal na crítica, que os críticos se esforçam por alcançar e cujos parâmetros são fixados, justamente, pelos ensaístas da literatura. Estamos, pois, em face de duas famílias de espírito, as duas únicas existentes, segundo um mestre do pensamento francês - os inteligentes e os historiadores: aqueles são espíritos analíticos que, em busca do sentido e da significação, procuram compreender a realidade, enquanto os outros "prevêem em retrospecto o que não serve para nada", formas intelectuais correspondentes às distinções de San Tiago Dantas entre "as inteligências de exposição" e as "inteligências de compreensão". Ora, no limite, as perspectivas se invertem, pertencendo o crítico às "inteligências de compreensão" e o ensaísta às "inteligências de exposição", ponto em que se confundem as categorias judicativas. De fato, é inimaginável um grande ensaísta que não seja ao mesmo tempo um grande crítico, e um grande crítico que não seja um grande ensaísta.

Apesar e até por causa dessas contaminações, as duas espécies não se confundem. Sendo essencialmente ensaísta, Carpeaux espera do leitor que tenha conhecimento substancial de obras e autores, além, bem entendido, dos contextos históricos e culturais em que se inscrevem. Em outras palavras, o ensaísta pressupõe no leitor o crítico capaz de lhe avaliar as afirmações e negativas, julgamentos e alusões. Eis um exemplo: "Será impossível admirar Milton e Shelley ao mesmo tempo? 'Byron e Shelley' é um absurdo, mas 'Donne e Shelley' ou 'Keats e Shelley' é razoável. Será possível acrescentar à afirmação de qualquer outro valor de poesia inglesa um '... e Shelley' ".

Palavras enigmáticas para quem não souber exatamente o que tais nomes implicam e representam no quadro de valores da poesia inglesa, mais do que na imaginária "poesia universal" ou da não menos mirífica "poesia". Nessas coordenadas, Carpeaux foi também, entre nós, um herói civilizador: como crítico, assegura que Eliot "é o maior que o século ouviu depois de Croce", de forma que é preciso conhecer, antes de mais nada, a estatura de Croce. Eliot, observa Ivan Junqueira, "revelou a capacidade de descobrir nas grandes obras do passado valores que nos passaram despercebidos... ensinou-nos a ler Dante ... Baudelaire ... Webster ... Donne (...)" - mas, não se trata de acreditá-lo sob palavra, mas, antes, de julgar os seus julgamentos, tarefa em que será implícita a existência de leitores razoavelmente cultos.

Não devemos lê-lo à procura de informações didáticas, mas como fonte de conhecimento (no singular) e até de contestação às nossas próprias certezas, para o que será preciso repercorrer, em cada caso específico, o seu próprio trajeto. Tomemos um exemplo familiar: "Não me cabe acrescentar mais um elogio aos que melhor autorizados já se acumularam para celebrar em Antônio Vieira 'a encarnação do gênio da língua'" - território predileto das "inteligências de exposição". Eis onde entrar a "inteligência da compreensão": "Vieira foi um daqueles grandes poetas em prosa que ilustraram a época barroca. Parece fenômeno principalmente literário. Em virtude de suas riquezas inesgotáveis de vocabulário e sutilezas sintáticas, o sermonista e epistológrafo virou domínio dos filólogos e gramáticos. Mas nem sempre se fez jus à surpreendente modernidade de suas idéias".

Podemos vê-lo como tronco da vigorosa família estilística que, prolongando-se em Rui Barbosa (discípulo confesso/rival implícito) e Euclides da Cunha, revigorou-se em nossos dias com Guimarães Rosa. Mas não é só: os regionalistas paradigmáticos (Afonso Arinos, Alcides Maya, Hugo de Carvalho Ramos, Alberto Rangel) tampouco recusaram os festões e astrálagos barrocos. Note-se que Simões Lopes tinha em Coelho Neto o seu mestre reconhecido - o Coelho Neto que os modernistas e modernosos se empenharam em desqualificar, mais tarde ressurgido por inesperado na obra de Guimarães Rosa, filiação tão escandalosa que as nossas inteligências de exposição até hoje não perceberam.

São as mesmas que de repente descobriram a modernidade do barroco, modernidade ironicamente datada do século 17, porque poucos leram Vieira e Camões, enquanto outros tantos pensam que não é preciso ler Rui Barbosa, se é verdade que tomaram Guimarães Rosa como novidade estilística. É o fascínio bastardo das vanguardas, condenadas, como escrevia Carpeaux, a morrer antes de se esgotarem, apaixonadas, limitadas e medusadas pela própria fugacidade.

coluna de Wilson Martins
Caderno Idéias
JORNAL DO BRASIL
04/03/2006

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