A EDUCAÇÃO NACIONAL
João Alexandre Barbosa
(em “A vertente pedagógica”, ensaio introdutório
à terceira edição)
Se a melhor parte da obra de José
Veríssimo Dias de Matos (1857-1916) vai surgir, sobretudo,
com a sua transferência para o Rio de Janeiro, em 1891 –
quando, pelo Jornal do Brasil, então dirigido por
Rodolfo Dantas, inicia uma atividade de crítica jornalística
que o acompanhará até as vésperas de sua morte
através de O Imparcial –, o seu período
anterior, aquele em que começa a sua existência de
escritor no Pará, seu estado natal, é rico em obras
e realizações em nada desprezíveis como indicadoras
substanciais de sua formação.
Quanto às obras, além dos folhetos
Emílio Littré (1881) e Carlos Gomes
(1882), sobressaem Primeiras Páginas (1878), Cenas
da Vida Amazônica (1886) e a primeira série dos
Estudos Brasileiros (1889) – a segunda foi editada
já no Rio de Janeiro, em 1894. Quanto às realizações,
fundou e dirigiu a Revista Amazônica (março
de 1883 a fevereiro de 1884, em dez fascículos) e o Colégio
Americano (de 1884 a 1890), além de ter sido, neste último
ano, Diretor de Instrução Pública do Estado
do Pará.
Não é difícil verificar
de que modo, nos textos publicados em 1878 e 1890, que constituem,
por assim dizer, a sua primeira fase, o que predomina é o
esforço de compreender o estado intelectual e cultural do
país, seja através de estudos etnográficos
(a que, de certa forma, pertencem as “ficcionalizações”
das Cenas da Vida Amazônica), seja através de
ensaios de síntese em que busca compreender, sob a inspiração
das teorias evolucionistas e positivistas do tempo, a evolução
da vida intelectual e da própria literatura brasileira, como
nos ensaios “A Literatura Brasileira, sua formação
e destino”, “O Movimento Intelectual Brasileiro de 1873-83”,
“Literatura e Homens de Letras no Brasil” e “Do
Nacionalismo na Poesia Brasileira”, todos incluídos
nos Estudos Brasileiros. E precisamente no fim à Introdução
que escreveu para este livro de 1889 afirmava:
De fundamento e de sobejo conheço a geral
e contristadora indiferença do nosso público legente
pelos escritos exclusiva e essencialmente brasileiros. Esse desinteresse
explico-o pela ausência de sentimento patriótico e
pela artificialidade da vida das nossas capitais dominadas por elementos
estrangeiros e, neste ponto ao menos, hostis; causas ambas que por
sua vez derivam da nossa desídia de mestiços e da
falta absoluta de educação nacional, qual a
compreendem não só as nações tradicionalistas
do velho mundo, mas também os Estados Unidos.
É a este desígnio que vão
responder os dois textos escritos antes da transferência definitiva
para o Rio de Janeiro e com os quais encerrava a sua fase provinciana:
A Educação Nacional, publicado no Pará
em 1890 e republicado no Rio, pela Francisco Alves, em 1906, e a
Memória apresentada ao governo do estado em 1891: A Instrução
Pública no Estado do Pará em 1891.
No futuro, ainda haveria de voltar ao tema educacional:
sem mencionar os artigos em jornais e revistas, a educação,
ou melhor, a instrução, juntamente com a imprensa,
seria objeto de um longo estudo, publicado no Livro do Centenário,
de 1900. Todavia a obra de 1890 – esta que o leitor tem agora
sob os olhos – ficaria como a mais representativa e importante
da vertente pedagógica do crítico.
(Diga-se, entre parênteses, que a obra
é hoje atravessada por três tempos diferentes: em primeiro
lugar, é o texto de 1890 precedido de sua Introdução;
em segundo, é a sua reedição de 1906, com a
longa e importante Introdução, assim como o acréscimo
do capítulo sobre “A Educação da Mulher
Brasileira”; em terceiro lugar, a Introdução
ao livro de 1906 reproduz extensamente o texto que escreveu, no
Jornal do Brasil, em 1892, fazendo a crítica da Reforma
Benjamin Constant.)
Escrita sob o impacto da transformação
republicana, a obra era explicitamente elaborada como uma contribuição
às reformas que deveriam surgir com o novo regime político.
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