CRÔNICAS DA CONVERGÊNCIA
/ ENSAIOS SOBRE TEMAS JÁ NÃO TÃO POLÊMICOS
Guilherme Fiuza
Há um bordão, nas
redações de jornais, que os editores sempre recitam
quando os repórteres se alongam demais na explicação
da matéria que trouxeram da rua: “Senta e escreve”.
São as palavras mágicas para aferir, rapidamente,
se o discurso animado do repórter tem tradução
concreta – isto é, se sobrevive em contato com a frieza
do papel.
Gustavo Franco tem um editor
imaginário desses na cabeça. Quando as teses brilhantes
do Plano Real orbitavam a muitos metros do solo, ele foi o membro
da equipe que tomou essa providência: sentou e escreveu. Acabou
virando uma espécie de “relator” daquele grupo
histórico, porque aparecia, a cada reunião, com um
papel onde ordenara e dera sentido prático às belas
conjecturas da reunião anterior.
Dizem as más línguas
que os economistas constroem suas teses para forjar um sentido à
realidade que não compreendem. Eis aí o principal
atrativo destas Crônicas da Convergência:
a economia jamais é um pretexto para a pena do autor. Ao
contrário, o leitor notará que são textos pregados
ao chão da realidade, e a serviço dela, cada artigo
provavelmente nascido de uma dessas ordens do editor imaginário,
ao ver passar uma boa idéia sobre o Brasil e o mundo: “Senta
e escreve”.
E que “convergência”
é essa? Simplificando um pouco, é a notícia
que Gustavo Franco vem nos trazer sobre o jogo entre globalização
e antiglobalização, disputado nesta virada de século:
está 1 x 0 para os primeiros. Ou seja, ele constata que as
principais forças políticas no Brasil convergiram
para os consensos internacionais do mercado, numa vitória
acachapante das teses reformistas. “Vitória acachapante”
são palavras do autor, e vai aí também uma
notícia sobre sua personalidade: não se espere encontrar
nos quase 200 artigos que se seguem um economista glacial, obcecado
pela assepsia e pela eqüidistância. Gustavo Franco costuma
vestir ostensivamente a camisa dos ideais em que acredita. E deixá-la
empapada de suor e barro na peleja com seus antagonistas. Vejam-no
em campo:
“O fato é que,
especialmente no período 1999-2005, o modelo econômico
do esquerdismo nacionalista jurássico (...) ficou reduzido
a um punhado de radicais que deixaram o Partido dos Trabalhadores
a bordo de uma melancólica Kombi cor de sangue”.
Eis um crítico sem cerimônia,
que não hesita, por exemplo, em classificar certas idéias
simplesmente como “erradas”, e ponto final. Autoritário,
acusarão alguns. Ousado, defenderão outros. Mas, no
final das contas, o fato é um só: Gustavo Franco sentou-se
e escreveu um pedaço da história econômica brasileira;
a única escolha inteligente à disposição
de convergentes e não-convergentes é sentar-se e lê-la.
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