WhatsApp:  (21) 98563-3713
COMPRAS      
 
TOPBOOKS - EDITORA E DISTRIBUIDORA DE LIVROS

Topbooks 30 anos

A Editora Imprensa Homenagens Especiais Destaques Recomendados e-Books Como comprar Fale conosco Início do site
30livrosA10reais
CATÁLOGO APRESENTAÇÃO
 
 
 
Instagram
 
WhatsApp:
(21) 98563-3713
TOPBOOKS - Editora e Distribuidora de Livros

O MUNDO À SOLTA

Silviano Santiago

Entregue à própria sorte. O mundo gira. Entregue ao acaso dos ventos ideológicos, das explosões fratricidas e das misérias locais. O mundo está à solta. Não como balão ou papagaio, cabelo feminino ou pássaro de canto alvissareiro. “O planeta tem raiva”. Está à solta como cavalo liberto das rédeas ou goela de cão hidrófobo ou drone em missão de rapina. “Não há mais deuses secretos / seitas cifras tarôs. / Tudo ficou aberto”.

À mesa da poesia, Felipe Fortuna recebe o mundo aberto e faminto, no meio da carnificina humana e do desatino cósmico. “O mundo se vasculha me vasculha. / Não exagero”. Atacado, o hospedeiro contra-ataca. Felipe clica de repente e sucessivamente o mundo à solta, como se fosse a lente Panoscan que permite aos peritos da NYPD captar imagens em 360 graus das cenas de crime. “Tudo se abriu, / tudo ficou aceso e surgiu um palco / e súbito sumiram as torres gêmeas”. Felipe retoma a experiência dos anos 1920 oferecida em imagens por Dziga Vertov e a dos anos 1930 escrita em prosa por John dos Passos. Ele é a eye-camera sensível e cosmopolita em tempos em que - estamos no século XXI - o mundo anda de novo à solta.

O mundo à solta – a coleção de poemas - fotografa como quem vê tudo. Arquiva documentos. Comenta-os ao relento. Analisa-os fora da faixa de pedestre. O poeta fica onde está, desde Canudos, My Lai e Alcácer-Quibir. “Não Ultrapasse”. Diagnostica os mosaicos que caem na forma de Guernica. Entoa um mantra: “é necessário / reduzir os desastres naturais”. Nenhuma catástrofe é natural. As tragédias são tão fabricadas quanto a granada que leva pros ares guitarras narguilés panos joias sedas e o corpo inocente de Samir. O rapaz morre no souk “sem saber, em meio à guerra, / como e por que barganhar”. É preciso erradicar a pobreza. Combater a desertificação.

Por guardar na memória poética os processos em aberto do século XXI, O mundo à solta pode ser objeto de queima de arquivo, como a testemunha que viu tudo. Aliás, o racista, que é vizinho, “entende como se fabrica / um novo artefato explosivo. / Amanhã morrerá um homem / muito diferente do intolerante”. Felipe entoa outro mantra: “Tanto desastre também exige / reduzir os orçamentos militares, fazê-los / tão pequenos quanto uma continência”.

Não é só o mundo que anda à solta. Como alegoria em mapa medieval, o fora da terra - a rosa dos ventos - também está à solta. Dos ares somos aspergidos de “herbicídio fungicídio biocídio”. Os pilotos do B-29 sobrevoam a cidade “(onde plantaram, cada um, / seus maiores cemitérios)”. Abre-se a paisagem: “gás cianídrico tabun napalm sarin”. Também o debaixo da terra está à solta e mata: “foi decidido onde enterrar/dejetos radioativos”.

Se é que ainda há lugar para os Senhores da Paz, quando é que chegarão? Talvez nunca, já que o mundo gira e “Todas as raças se exportam. / Todos os credos comportam / ofendidos e humilhados”. No entanto, “Todos sabem sorrir”. Nós também, “nesse país pacato, tão / disciplinado, há séculos reformado”. E ainda o drone, que sorri em silêncio no poema, depois de desligados os motores.

Felipe suplementa esse mundo “sobrecarregado” com o cotidiano da Londres ordeira, onde invoca a boa poesia. O mundo à solta está chocho. O dia a dia está esvaziado de páthos; em ambiente jornalístico hostil, os valores da boa poesia foram desocupados pelas intenções políticas da arte. Nas suas “Idas & voltas a Londres”, o espanto do “diplomata alerta” abre as portas como um vagão. Nele sobem fantasmas de soslaio, almirantes defuntos, vias férreas e telescópios. O espanto se constrói com perguntas. Nenhuma resposta. Só o clamor pelas flores distantes: “todo o jardim parece meu poema”. Este deve “não ser lido por quem antipatiza”. No entanto, se lido, se transformará não em explosão ou em suspiro, “mas / num tuíte”. Desligados os motores do poema, o poeta como o drone sorri.

Constituído e destituído de páthos, O mundo à solta leva o leitor a sobrenadar próximo à rosa do povo, enquanto veste e protege o poeta com o escafandro da vida diplomática. Apaixonado e ambivalente, O mundo à solta coloca Felipe Fortuna entre os melhores poetas da atual geração de indignados. As “astúcias da mímese”, para retomar José Guilherme Merquior, fazem-lhe bem e o retiram do beco sem saída de A mesma coisa, seu livro anterior. Pelas fendas abertas pelo depoimento humano, O mundo à solta respira o cheiro sulfúrico do milênio.

Privacidade

Envio de originais

Mensagem do Editor

Topo Início Anterior
TOPBOOKS EDITORA E DISTRIBUIDORA DE LIVROS LTDA.
Rua Visconde de Inhauma, 58 - Sala 203 - Rio de Janeiro - CEP 20091-000
Telefones: (21) 2233-8718 ou (21) 2283-1039
Copyright © Topbooks, 2003 - 2024 - É proibida a reprodução total ou parcial sem autorização - Projeto QV