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TRÊS PEÇAS: MINNA VON BARNHELM OU A FELICIDADE DO SOLDADO / EMILIA GALOTTI / NATHAN, O SÁBIO

Desde Lutero, a Alemanha não produziu um homem maior e melhor do que GOTTHOLD EPHRAIM LESSING. Esses dois são nosso orgulho e glória. (...) Assim como Lutero, Lessing não exerceu sua influência apenas ao fazer algo determinado, mas também ao tocar o povo alemão da maneira mais profunda e produzir um saudável movimento espiritual através de sua crítica e de sua polêmica. Foi a crítica viva de sua época, e toda a sua vida foi polêmica. Essa crítica se fazia presente no domínio mais amplo do pensamento e do sentimento, na religião, na ciência, na arte. A polêmica sobrepujava todos os adversários e se fortalecia a cada vitória. Lessing, como ele mesmo admitiu, precisava da luta para seu próprio desenvolvimento espiritual. (...) Todos estremeciam à vista da espada de Lessing. Nenhuma cabeça estava a salvo dela. (...) Aqueles a quem sua espada não podia alcançar, matava-os com a seta do seu chiste.

É notável que o homem mais chistoso da Alemanha tenha sido também o mais honrado. Nada se compara a seu amor à verdade. Lessing não fazia a menor concessão à mentira, ainda que pudesse favorecer a vitória da verdade através dela, à maneira habitual dos que são versados nas coisas do mundo. Podia fazer tudo pela verdade, exceto mentir. Quem pensa – disse certa vez – em esposar a verdade sob toda espécie de disfarces e arrebiques, pode muito bem se tornar seu alcoviteiro, mas jamais será seu amante. (...) A arte era igualmente uma tribuna para Lessing e, se o arrancavam do púlpito ou da cátedra, saltava ao teatro, e ali ainda falava de modo muito mais claro, e conquistava um público ainda maior.

Heinrich Heine
(em Contribuição à história da religião e filosofia na Alemanha,
tradução de Márcio Suzuki, Iluminuras, 1991)


Sua atitude em relação ao mundo não era positiva nem negativa, mas radicalmente crítica e, quanto ao âmbito público de sua época, totalmente revolucionária. Mas era também uma atitude que permanecia em dívida para com o mundo, sem nunca abandonar o sólido terreno do mundo, e jamais chegar ao extremo do utopismo sentimental. Em Lessing, a têmpera revolucionária se associava a uma espécie curiosa de parcialidade que se apegava a detalhes concretos com um zelo exagerado, quase pedante, e fazia surgir muitos mal-entendidos. Um componente da grandeza de Lessing foi o fato de nunca permitir que a suposta objetividade o levasse a perder de vista a relação real com o mundo e o estatuto real das coisas ou homens no mundo que atacava ou elogiava.

A crítica, na acepção de Lessing, sempre toma partido em prol da segurança do mundo, entendendo e julgando tudo em termos de sua posição no mundo num determinado momento. Tal mentalidade nunca pode dar origem a uma visão definida do mundo que, uma vez assumida, seja imune a experiências posteriores no mundo, por se agarrar solidamente a uma perspectiva possível. Precisamos muitíssimo de Lessing para nos ensinar esse estado mental, e o que nos dificulta tanto aprendê-lo não é nossa desconfiança em relação ao Iluminismo ou à crença do século XVIII na humanidade. Entre Lessing e nós está não o século XVIII, mas o século XIX. A obsessão do século XIX com a história e o compromisso com a ideologia ainda se manifesta tão amplamente no pensamento político de nossos tempos que somos inclinados a considerar o pensamento inteiramente livre, não utilizando como muleta nem a história nem a lógica coercitiva, como desprovido de qualquer autoridade sobre nós.

Hannah Arendt
(em Homens em tempos sombrios, tradução de
Denise Bottmann, Companhia das Letras, 1987)



Quando Lessing se opõe à teoria e à prática do trágico Corneille, parte de qual ponto de vista para fazê-lo? Parte, precisamente, de que a concepção do trágico por Corneille é inumana, de que Corneille ignora o ânimo humano, a vida afetiva, porque, preso às convenções cortesãs e aristocráticas de sua época, não pode oferecer mais que construções puramente intelectuais. A grande polêmica teórico-literária de ilustrados como Diderot e Lessing se dirigiu contra as convenções nobiliárias. (...) Entre a luta de Lessing contra a frieza da tragedie classique e sua proclamação dos direitos da inteligência – por exemplo, em matéria religiosa – não há a menor contradição.

Georg Lukács
(no ensaio "Os sofrimentos do jovem Werther")


Todas as suas obras, incluídos os dramas, desde Der junge Gelehrte (O jovem erudito) até o Nathan, são escritos polêmicos, mais ou menos camuflados porém inequívocos. A senhorita Von Barnhelm e o comandante Von Tellheim flertam e polemizam, e quase sempre fazem as duas coisas ao mesmo tempo. A polêmica como flerte era algo que nem sequer Shakespeare conheceu; ocorreu, talvez, em Molière, mas, em última instância, o seu descobridor foi Lessing. Não há dúvida de que manejava todos os registros da controvérsia, e a todos dominou com virtuosismo, como nenhum outro alemão antes ou depois dele.

Marcel Reich-Ranicki
(em Die Anwälte der Literatur / Os advogados da literatura)


LESSING é o maior crítico literário do século XVIII. (...) Pôs toda a sua erudição imensa a serviço das lutas literárias; a sua crítica é sempre polêmica, é jornalismo no mais alto sentido da palavra, jornalismo de um lutador de coragem inédita para atingir o idealismo mais puro, servindo-se de um estilo rápido, epigramático, mordaz, eloquente: a primeira prosa moderna em língua alemã. Possuía o talento de matar os seus adversários; mas só empregou a arma terrível com o fim de contribuir para a vitória das suas idéias justas. (...) O teatro, isto é, a poesia em movimento físico, significou para ele, como para todo o século XVIII, o cume mais alto da literatura.

Otto Maria Carpeaux
(em História da literatura ocidental)

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