POEMAS INQUIETOS
Felipe Moraes
Uma inquietação sobre a própria
condição de poeta parece transbordar dos versos de
A mesma coisa (Topbooks), novo livro de Felipe Fortuna. No
título (que ele lança hoje, às 19h, no restaurante
Carpe Diem, em Brasília), três poemas de fôlego,
distribuídos em pouco mais de 80 páginas, concentram
observações urgentes sobre o fazer poético:
a preocupação com a cópia, o desencanto com
a criação e, por fim, um sentimento de revolta. “São
longos e reflexivos”, diz o diplomata carioca que, entre idas
e vindas, vive em Brasília desde 1989.
“O principal, que dá título
ao livro, tenta ser uma reflexão sobre a cultura da imitação.
A ideia da originalidade está desaparecendo. O segundo é
um poema que lembra escritores e, sobretudo, poetas que se suicidaram.
A poesia salvaria essas pessoas? Ou será que a poesia as
levou à morte?”, indaga. No último, Fortuna
revela suas faces de crítico literário e observador
da produção poética – até 2009,
assinou coluna sobre os temas no Jornal do Brasil. O poema,
não por acaso, é chamado Contra a poesia. “São
reuniões de ideias de vários pensadores e escritores
que, em algum momento, voltaram-se contra ela”, explica.
Versos renegados
O autor, publicando hoje seu quinto livro de poesia – e décimo
primeiro no geral –, cita exemplos clássicos de detratores
de versos. O filósofo Platão desprezava Homero. Isaac
Newton, cientista de contribuição notável para
a física e a matemática, tinha repulsa à subjetividade.
“Newton, entre outras coisas, decompôs a luz em espectros.
E outro inglês, o escritor John Keats, escreveu um poema dizendo
que, com a luz agora decomposta, lá se foi a poesia. Ficou
apenas a verdade. Houve intensos debates sobre se a ciência
era contra a poesia”, relata.
Mas Fortuna avisa: apesar do aparente pessimismo,
há também muito de ironia no que escreveu em A
mesma coisa. Em versos do poema homônimo, não faltam
passagens como essa: “Estou preparando nova armadilha em cada
esquina. Vou congregar a ordem dos capazes de imitar”. Enquanto
o primeiro e último “capítulos” partem
de preocupações com autoria e do que ele define como
“sobrevivência” da poesia num mundo científico”,
o texto central, O suicida, carrega experiências das
viagens internacionais. Uma das mais marcantes foi na Rússia,
de onde retornou em 2009. “Nunca tinha visto um país
em que tantos poetas se mataram, por questões pessoais ou
políticas”, conta.
Publicado no Correio Braziliense em 29.11.2012.
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